O Workshop com os professores e curadores Eduardo Sterzi e Veronica Stigger se divide em três módulos:
Módulo 1: Das casas em ruínas aos museus de tudo: moradas instáveis da poesia contemporânea brasileira, com Eduardo Sterzi (UNICAMP)
Em 1975, João Cabral de Melo Neto publicou Museu de tudo, reunindo poemas escritos entre 1966 e 1974. É um livro que assinala uma ruptura no percurso cabralino, sobretudo se o confrontamos com o título imediatamente anterior, A educação pela pedra, de 1966 – este, rigorosamente ordenado, aquele, conforme descreve o próprio autor, «depósito do que aí está», ou ainda: «caixão de lixo ou arquivo». Pode-se dizer que, com este livro, algo como um pensamento do museu que passava pela crítica e renovação da própria ideia tradicional de museu – já então atuante em outros âmbitos da cultura brasileira, sobretudo na arquitetura, com Lina Bo Bardi, e nas artes plásticas, com Hélio Oiticica – ingressa com força no pensamento da poesia. É a partir do exame dessa aproximação entre museu e poesia que buscaremos refletir sobre experiências literárias diversas como a do próprio Cabral, a de Haroldo de Campos e a de Carlito Azevedo.
Módulo 2: Flávio de Carvalho: experiências, com Veronica Stigger (FAAP)
Por meio da noção de experiência, o artista brasileiro Flávio de Carvalho levou a atividade artística a transbordar das esferas tradicionalmente reservadas à arte, conduzindo-a além mesmo dos novos espaços conquistados pelo modernismo. Se com a Experiência n° 2 (andar no sentido contrário ao de uma procissão de Corpus Christi, com chapéu à cabeça) bordejou a psicologia social e a antropologia e com a Experiência n° 3(desfilar pelas ruas com um traje masculino concebido para os trópicos: o New Look) anexou a seu trabalho a história e a prática da moda, com a última experiência, aquela que ficou conhecida como Experiência n° 4 (viajar à Amazônia para encontrar e estudar tribos indígenas e produzir um filme sobre a «deusa loura»), somou a suas pesquisas a prática etnográfica. Nesta conferência, pretende-se mostrar como, nesta derradeira experiência, a postura de Flávio de Carvalho, em suas ações e seus escritos, se acha próxima àquela do etnógrafo e, portanto, seria possível perceber nexos mais profundos entre tal postura e aquela, experimentada algumas décadas antes, pelo grupo de escritores e antropólogos ligados à revista Documents e ao Collège de Sociologie, que praticavam aquilo que James Clifford definiu como «surrealismo etnográfico».
Módulo 3: Variações do corpo selvagem: Eduardo Viveiros de Castro, fotógrafo, com Eduardo Sterzi e Veronica Stigger – apresentação das fotos e debate
Eduardo Viveiros de Castro é reconhecido internacionalmente como um dos mais importantes antropólogos da atualidade. Com a teoria do perspectivismo ameríndio, desenvolvida a partir de meados da década de 1990, passou a ter notável influência em outros campos do conhecimento – na estética, na teoria literária, na filosofia política, na filosofia do direito e talvez sobretudo na prática artística. O que poucos de seus leitores sabem é que Viveiros de Castro, antes de ser antropólogo, foi fotógrafo, sendo responsável por algumas das imagens mais emblemáticas do artista plástico Hélio Oiticica e do poeta Waly Salomão, assim como pelas fotografias de cena de filmes do cineasta Ivan Cardoso (de quem também foi roteirista). Esta exposição, projetada originalmente para o SESC Ipiranga em São Paulo (Brasil) e que em 2017 começará sua itinerância internacional, apresentou pela primeira vez um amplo recorte do trabalho fotográfico de Viveiros de Castro, agrupando cerca de trezentas imagens produzidas tanto no período de colaboração com estes artistas como também, principalmente, aquelas realizadas ao longo de sua atividade como etnólogo junto aos índios Araweté, Kulina, Yanomami e Yawalapiti. O ponto de intersecção dos dois grandes conjuntos que constituem a exposição está na centralidade do corpo. Trata-se de uma ênfase na corporalidade que está também na origem da reflexão antropológica do autor e que marca todo seu percurso intelectual – e que, por isso, consideramos decisiva para se compreender a articulação, em sua práxis, entre fotografia e pensamento, arte e antropologia. Os curadores da exposição apresentarão as fotos que a compõem e debaterão seus pressupostos e procedimentos.